domingo, 14 de junho de 2009

Temas e conteúdos históricos abordados no filme o Homem da Capa Preta


Temas e conteúdos históricos abordados:

O principal conteúdo histórico que percorre todo o filme são os 19 anos que durou o populismo. Segundo a leitura que o diretor Sérgio Rezende fez, os populistas são apresentados pela figura de Natalício Tenório Cavalcanti de Albuquerque e estão ao lado do povo. No caso de Tenório, emergiram do próprio povo. Tanto que nos momentos em que o deputado Tenório se afasta do povo, sofre grandes derrotas e fica isolado politicamente. Populistas históricos tradicionais como Getúlio Vargas e mais superficialmente Jânio Quadros, são vistos sutilmente como inimigos.
O período temporal do filme percorre os 19 anos de populismo começados historiograficamente em 1945, com o fim do Estado Novo de Getúlio Vargas e a eleição de Eurico Gaspar Dutra, até a Revolução Gloriosa de 1964, conhecida menos gloriosamente como golpe militar, cujo primeiro presidente foi Humberto de Alencar Castelo Branco.
Passam-se por estes diferentes anos, diferentes presidentes. Dutra (1945-1951), Getúlio Vargas novamente (1951-1954), o presidente João Fernandes Café Filho (1954-1955) que sucedeu Vargas após o suicídio, Juscelino Kubitschek (1956-1961), Jânio Quadros (de favereiro a setembro de 1961), João Goulart (1961-1964) e Castelo Branco (!964-1967). O filme consegue passar a instabilidade do populismo que em menos de 20 anos teve seis presidentes dos quais apenas dois cumpriram todo o mandato, que foram Dutra e JK.
Os idealizadores do filme não deixaram de considerar o fato de estarem produzindo a película em 1986, logo após o fim do regime. Assim, dialogam diretamente com os anseios de um público que quer vilanizar os militares e exaltar os últimos democratas antes do golpe. Em função disto Tenório era um democrata populista que se aliou a João Goulart. Ambos foram perseguidos assim que os militares tomaram o poder. Eles foram os últimos democratas e estavam ao lado das massas. Os inimigos de Tenório, por outro lado, acabaram todos ao lado da ditadura, perseguindo o povo.
Tenório é como o povo: fala o que pensa. Seus inimigos atuam sempre escondidos, confabulando em reuniões em que suas caras não aparecem. Assim é Afonso Arinos, com atitudes indiretas de nomear cargos para perseguir seus opositores. Essa é a linha que Rezende se utiliza para contar os fatos do populismo como pré-cessor do regime militar em diálogo com o momento de pós-ditadura.

Filme O Homem da Capa Preta e sua História


O filme começa em Alagoas, com o nascimento de Natalício Tenório Cavalcanti de Albuquerque em 1909. Uma poesia de cordel fica ao fundo, enquanto a mãe de Natalício fecha o corpo de seu filho com dizeres que remetem à cultura e à tradição do sertão nordestino.
Natalício, já crescido, presencia a morte de seu pai, Antônio Tenório. O mesmo assassino de seu pai volta anos depois para matá-lo, mas Natalício se aproveita enquanto a arma do jagunço falha e mata o algoz de seu pai à inchadadas.
O enredo salta para a metade da década de 1940, quando Getúlio abre eleições diretas, e mostra Tenório Cavalcanti como um deputado estadual eleito em Duque de caxias, no Rio de Janeiro. Em seu discurso de posse enfatiza: “o povo agora tem um advogado e um defensor”, empunhando a constituição na mão esquerda e sua metralhadora Lurdinha na mão direita, usando uma capa preta que demonstra ao povo que eles agora têm um denfensor.
Tenório se mostra como um típico político populista, que com uma mão acaricia o povo e com a outra manipula. Escutando os problemas do povo, pouco resolve, geralmente transferindo para outros, inclusive para Deus. Andando entre o povo de Duque de Caxias e perguntado por pessoas que bebiam na rua para que time torcia Tenório, este respondeu: “sou Flamengo de coração, Fluminense por convicção, mas eu torço mesmo é para o Bota-Fogo”.
Alcançando uma popularidade cada vez maior, Tenório Cavalcanti também passa a acumular cada vez mais inimigos, principalmente entre os políticos do PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), representado no filme pelo deputado Afonso Arinos, inimigo pessoal de Natalício, que chega à câmara Federal pela UDN (União Democrática Nacional).
E o PTB consegue eleger o prefeito, o governador e o presidente, podendo assim agir contra Tenório em Duque de Caxias. É o que acontece. O delegado Lima Maragato vai para a cidade e passa a perseguir sem clemência os aliados de Tenório. Em um evento em que o delegado manda que Tenório tire o chapéu na sua presença e o deputado não acata, Maragato derruba o chapéu de Natalício, que se abaixa para peg-alo e é fotografado de joelhos diante do delegado, abalando sua carreira política.
A partir de então Tenório não usa mais a capa preta e a cidade entra em estado de guerra civil, com morte de vários lados, inclusive a do delegado Maragato.
Sem uma preocupação em mostrar os anos se passando, o filme passeis pelos governos de Getúlio Vargas, de 1951 a 1954; de Juscelino e de Jânio Quadros quase que imperceptivelmente, não fosse pelas expresões dos atores que eram envelhecidos. A instabilidade política do país é contada pelo discurso de Tenório, que sai da UDN para tentar o governo da Guanabara contra Carlos Lacerda e perde. Após a derrota fica sozinho e sem o apoio de seus antigos e fiéis aliados, um camponês e um jornalista, que discordavam da atuação inflexível de Natalício.
Derrotado nas urnas e sem apoio, o homem da capa preta revê suas atuações políticas e resolve mudar, refazendo as alianças perdidas porém com um novo discurso, que agora se aproximava de João Goulart, portanto visto como de esquerda para a época. O jornal Luta Democrática é a voz destas novas idéias, consumido pelas classes mais populares do Estado.
Mas o golpe militar representa também um duro golpe para o renascimento político de Tenório. Seus aliados foram perseguidos e em breve chegaria a vez dele. O jornalista fugiu pela embaixada da Suíça enquanto o operário resolveu ficar e resistir, provavelmente em guerrilhas.
Tenório também ficou. Estava novamente com a Lurdinha em uma mão e a capa preta sobre o corpo ajudando ao povo contra as injustiças dos poderosos. “não sou facista nem comunista. Sou Tenório Cavalcanti. Sou macho”. O político populista estava acima das ideologias.
Na visão do diretor Sérgio Rezende, Tenório é o herói. Um populista saído do povo e que busca governar para o povo. A constituição em uma mão e a metralhadora em outra estão de acordo com a própria representação da deusa grega da justiça que, de olhos vendados, traz em uma mão uma balança e na outra uma espada.
Natalício não entra em crises pessoais, que ficam representadas no papel de sua esposa, que tem breves surtos de loucuras.
Para Sérgio Rezende, o populismo é odiado pelos poderosos e aliado do povo. Tenório acaba do lado de Jango e seus inimigos são conchavados com o exército que tomou o poder. Desta maneira, o golpe militar é também um golpe no governo popular, democrático. Quando a cada de Natalício é cercada pelo exército, entenda-se como a casa de um representante do povo sendo invadida sem mandato, sem leis.
Na última sequência do filme, os militares entram novamente na casa de Tenório em busca de pessoas perseguidas pelo regime que supostamente estariam escondidas ali, no lar do político. Os soldados são liderados pelo arquirival Afonso Arinos, que se dirige a Natalício de diz que vai destruir seu nome e sobre ele jogar sal e pedras, ou seja, a punição dada a Tiradentes, um herói da liberdade. Essa é a visão que tenta passar Sérgio Rezende nesta sua leitura sobre o populismo, aproximando-a dos dias atuais, já que o filme é de 1986 e dialoga menos com o início do regime que com o seu final.
Todo o filme trabalha cores. No início do filme em que Tenório está sempre de preto, seus inimigos estão sempre de branco. Após deixar de usar a capa preta, Tenório é que passa a usar o branco e seus inimigos usam o preto. As câmeras geralmente utilizam-se de planos médios e closes quando Tenório fala, aproximando em planos-detalhes de sua boca ou expressões do rosto quando este discursa raivosamente. Quando seus opositores estão reunidos, raramente suas caras são mostradas, com planos nas mãos, nas roupas ou mesmo colocando objetos na frente do rosto, destacando a figura de Afonso Arinos.
O filme ganhou os prêmio de melhor filme, melhor atriz (Marieta Severo), melhor ator (José Wilker) e melhor música(D. Tygell) no festival de gramado de 1986.

A festa de Babette e um pouco de análise


Felipe Araújo de Carvalho

Analise do filme “A festa de Babette” segundo a perspectiva da história e da cultura da alimentação.

No jantar de Babette, ao analisar o silêncio dos convidados e após as suas atitudes, ou de como a comida derruba o fundamentalismo religioso, percebe-se que na realidade, houveram alguns momentos de silêncio durante o jantar de Babette. O primeiro deles foi pactuado entre os convidados, que prometeram não falar nada durante todo o banquete promovido pela francesa. O puritanismo religioso os fez prometer que não iriam fazer quaisquer comentários, e quando o jantar começou a ser servido, esse silêncio durou, porém por pouco tempo e não de maneira constante.
Um segundo silêncio pode ser detectado quando os convidados, ainda na mesa, começam a comer. De igual maneira durou pouco e não foi tão constante, sendo interrompido pelos elogios que os convidados faziam uns aos outros em contraste com as antigas desavenças criadas desde a morte do pastor.
Porém, acredito que a questão em si diga respeito mais especificamente ao silêncio que se seguiu após o banquete de Babette. Os convidados olhavam-se ternamente, de maneira carinhosa, como se nada precisasse ser dito. Estavam na sala de star completamente satisfeitos de corpo e alma; fisicamente e espiritualmente viam-se como um só corpo e uma só voz, o que se concretizou com o ato de darem as mãos e cantarem juntos ao redor do fogo assim que saíram da casa das irmãs castas e belas de outrora.
Um silêncio de um grupo que estava alimentado espiritualmente tal como se houvesses encontrado Deus ou estado diante do teto da capela cistina, pintada por Michelangelo. Um silêncio que foi quebrado pelo adeus dos amantes, com palavras amorosas ditas por um duro general e por músicas que uniam uma aldeia. Naquele momento o pastor morto não fazia falta, pois Babette mostrou outras formas de falar com Deus. Foi muito mais que derrubar um fundamentalismo religioso, pode-se dizer até que foi um resgate da religião que estava perdida.
Aliás, não é de hoje que filmes mostram alimentos quebrando corações de gelo. No filme Ratatouille, uma simples comida camponesa faz amolecer o coração de um frio crítico de restaurantes. Em “Morango e chocolate”, um rústico revolucionário cubano (Antonio Bandeiras) chega a tirar a roupa na casa de um homosexual declarado, após comer morangos com chocolate. Aliás, sonhando com chocolates, Willy Wonka, deixa as amarras dentárias de seu pai e vai em busca do seu doce predileto. No filme brasileiro “Estômago”, um cozinheiro torna-se o homem mais poderoso entre os bandidos de uma prisão porquê sabe cozinhar e até o mais perigoso entre os criminosos rende-se à comida do nordestino em Curitiba. Poderíamos ir mais longe, com filmes como “Tomates Verdes Fritos” e outros tantos mais, porém estes assinalados até aqui são alguns exemplos que ilustram como a comida quebra paradigmas.

A partir da frase “um artista nunca é pobre”, podemos analisar a cozinha como arte. Um artista nunca é pobre porque se alimenta espiritualmente e não fisicamente. Sua riqueza vem do que ele produz, do que ele realiza. Um artista não vê os elementos do dia a dia como simples mortais. Um pintor se alimenta de cores; um poeta se alimenta com palavra; um arquiteto se alimenta de espaço; um músico se alimenta de dor (?); um escritor bebe na própria imaginação; um desenhista come lápis e grafite.
O que satisfaz um artista está longe de ser facilmente compreendido. Para se fazer uma visita surpresa a alguém que vive de arte, é importante passar ao menos em uma panificadora antes. Cotidianamente, a geladeira de um artista é vazia, não havendo em seus ateliês muito mais que cigarros, bagunças e sujeiras... talvez uma coca-cola.
No caso de Babette, sua arte é a cozinha. A codorna é servida em um “sarcófago” comestível e para cada alimento há uma bebida, cada poção no seu devido momento. Da mesma forma que um pintor escolhe as cores, Babette escolhe os temperos. Assim como o desenhista tem suas ferramentas, como réguas e canetas, Babette tem suas panelas, fornos, etc. A dor que inspira um músico pode ser o odor que inspira um bom cozinheiro. Se o arquiteto faz milagres aproveitando e embelezando um espaço, o mesmo faz Babette em cada milímetro de um prato, uma taça ou uma mesa. A composição estética do artista da cozinha é como a de um quadro: precisa de beleza, inspiração e transpiração... uma verdadeira composição artística desde o dom, o processo, até finalizar com a conclusão. Pode-se dizer que é uma arte que alimenta no duplo sentido.

É possível fazer uma reflexão sobre o cinema como fonte para a história e a cultura da alimentação.Diversos são os filmes cujo tema é especificamente a alimentação. Com uma mensagem mais óbvia, são, em si, uma fonte para se compreender a cultura da alimentação na história do homem. Falamos um pouco sobre alguns deles ao responder a primeira questão.
Porém, mesmo filmes que não abordem esse tema de maneira mais detida, também acabam por trazer elementos que nos fazem refletir sobre a alimentação na história.
Há um certo filme sobre Luís XV que se inicia com o banquete ofertado, no qual o cozinheiro chefe é Gerard de Pardieu. “Super Size me” fala da alimentação dos norte-americanos nos dias atuais. Até mesmo películas simplórias, que mostram personagens pedindo café em beiras de estradas ou famílias alimentando-se na hora do almoço, servem como fontes de pesquisa para se entender a cultura da alimentação.
É comum vermos em filmes americanos serem servidos ovos com bacon e leite com sucrilhos; nos filmes que se passam na Europa, os cafés são as atrações, com pratos trazendo pouca comida a custo alto. Outra linha do cinema traz a comida preferida de astros, que geralmente escolhem comida fora do cardápio e nem sempre comem o que pedem.
Enfim, pegando-se toda a filmografia de um país e analisando os pequenos detalhes de como os momentos em que aparecem comidas são abordados, poderíamos ter infinitos elementos para conhecermos a própria cultura daquele país.